9.26.2006

 
O cara é daquela categoria de chato que tá sempre crente que tá abafando. Aquela categoria que não pode ver uma mulher e vai puxar assunto. E já tem a lenga lenga na ponta da lígua: acabou de levar um fora da namorada, está muito triste, está muito carente, é muito sensível, entende de astrologia. Saca qual é o tipo né?
Uma vez há muito tempo (uns seis anos, sei lá) ele veio puxar assunto comigo. Naquela época eu tentava contrariar minha natureza e era simpática com as pessoas, queria ser legal, tolerante com a diversidade, fazer amigos, essas babaquices. E mesmo assim já achei o mané extremamente MALA. Tanto que fingia que nunca fomos apresentados quando encontrava com ele no corredor da UFS, fugindo até de um "Oi, tudo bom?" com medo de ouvir um "Não, não está tudo bom. Eu to carente, o mundo não me entende, meu horóscopo disse que hoje seria meu inferno astral, et cétera.". Fingi tão bem que, passados alguns anos (eu disse ANOS), o mané achou que seria interessante se apresentar de novo. Eu estava caminhando na Orla, feliz em meio aos meus pensamentos quando ele me surge de bicicleta e segue ao meu lado:
- Oi! Nós não nos conhecemos de algum lugar?
- Não.
- Você não estuda na UFS?
- É.
- Faz o que?
* puta que la mierda!
- Rádio e TV.
- Legal. Eu faço geografia.
- ...
- Qual é o seu nome?
- Deborah.
- O meu é XXX.
- ...
- Você é sempre calada assim mesmo?
- Sou.
- Mas não acoteceu alguma coisa? Vc está triste?
- Não.
- Você é só introspectiva assim mesmo?
- Hum rum.
- Eu também sabe? Mas tenho andado mais instrospectivo esses dias...
* Não é possível que ele vai dizer DE NOVO a história de que levou um fora da namorada...
- Acabei de terminar um namoro longo sabe? Ainda não me recuperei e...
- Olha, eu gostaria de continuar minha caminhada sozinha tá?
- Ah, eu estou te atrapalhando?
- Tá.
- Desculpa. Vc caminha sempre por aqui?
* um. dois. três. quatro. cinco. ... dez.
- Não.
- Você mora por aqui?
- Não.
- Eu moro ali atrás.
- .
- Desculpa, eu to atrapalhando né?
* MAIS UMA VEZ:
- TÁ.
- Então a gente conversa outro dia quando vc não estiver tão concentrada nos seus pensamentos...
* Ou quando o Himalaia derreter.
- ...
- Prazer te conhecer, Deborah.
- .
Então. Hoje estou eu de MUITO mau humor (mais do que o de costume) entrando no ônibus e já ia comemorando a minha sorte do dia: um lugar vazio pra sentar! Viva! Então eu vejo quem está sentadinho na poltrona do lado... ele. Legal, prefiro ir em pé carregando uma manada de cem mamutes nas costas. Sentei no lugar atrás. Uma pobre desavisada ocupou a vaga ao lado do deficiente. Pra alegria dele que, dois minutos depois, já estava contando que tinha levado um fora da namorada e que estava muito carente. Eu juro por Fernando Pessoa!
Liguei meu botão [Mode Catatonia On] muito utilizado em percursos longos de ônibus e fiquei pairando no infinito do meu introspecto. Daí a pessoa que tava do meu lado me cutucou pedindo licença pra descer e me acordou do transe. Foi nesse momento que eu ouvi o termo "zen budismo" na conversa-monólogo entre o mala e a pbre coitada. Tive pena, mas é a vida. Não dá pra escoher quem senta no nosso lado no ônibus, infelizmente. [Mode Catatonia On] de novo e a viagem prossegue... Tive que voltar ao mundo no momento que chegou meu ponto e captei outro fragmento do monólogo: "...é um nome anglo-saxão...". Dá pra mensurar o nível de malice da conversa?
Agora vocês, homens, imaginem o que nós mulheres temos que agüentar no nosso dia a dia. É cantada de pedreiro, onanista, esfregação e conversas que começam com "to carente", passam por "zen budismo" e acabam com "...é um nome anglo-saxão..."! E às vezes é tudo no mesmo dia!
Na próxima encarnação eu quero nascer pedra.
posted by Arlequina @ 1:39 PM  
 



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