"Fredo, you're my older brother, and I love you. But don't ever take sides with anyone against the Family again. Ever." (Michael Corleone)
Falo mal dos meus amigos. Não por inveja, despeito ou – como gostávamos de dizer aos 15 anos de idade, mesmo sem compreender o peso real dessa palavra – falsidade. Falo mal porque eles são cheios de defeitos, porque me contrariam, porque nem sempre me dão a atenção suficiente pra satisfazer as necessidades dos meus caprichos. Falo mal como quem fala dos tios, primos, irmãos, mãe, pai. Falo mal porque posso, porque sou da famiglia.
A primeira vista, não temos quase nada em comum e quem vê assim, de fora, não entende que ponto nos prende nessa união sem qualquer compromisso. Eu também não entendo, só sei que a família é grande, de deixar qualquer italiano com inveja. Tem a avó que cuida de todo mundo, a mãe que se mete na vida de todo mundo, o pai que acorda de madrugada pra resolver problema na balada, o irmão mais velho que tem ciúme do namorado da irmã mais nova, o cunhado folgado que continua freqüentando a casa mesmo depois de terminado o casamento, os irmãos caçulas que animam mas dão trabalho, os primos distantes que só aparecem nas festas e, quando se juntam com os caçulas, todos sabem que alguma merda vai acontecer, coisas serão quebradas e alguém vai acabar numa ambulância. Têm aquelas outras famílias que são amigas e têm aqueles núcleos que são mais próximos uns dos outros. Mas todos se juntam em casamento, batizado, aniversário de criança e enterro. Adoro esses eventos!
E de vez em quando alguém traz convidados. Geralmente todos são bem vindos, desde que respeitem as regras da casa. Temos nossa própria ordem e não gostamos que tirem nossas coisas do lugar. E com freqüência descobrimos que algum eventual convidado é um parente distante nosso, errante no mundo, longe dos seus. Quando isso acontece, ele é prontamente acolhido e dificilmente se perde de novo.
Nossa afinidade é tão grande que de vez em quando esquecemos que precisamos interagir com o mundo fora do nosso clã e que a lógica universal geralmente não funciona que nem a nossa. Quando somos convidados (ou intimados) a comparecer em eventos de famílias estranhas, que às vezes até trazem o nosso próprio sangue e sobrenome, ficamos como o estrangeiro bizarro no canto da festa que sequer entende aquele idioma. Mesmo quando entendemos, somos o estrangeiro exótico que desperta curiosidade dos demais acerca da vida além mar. Mas uma coisa é certa: nossa entrada não é USB.
Então eu posso falar mal dos meus amigos, porque podemos falar mal de pai, mãe, irmão, tios, tias, primos. É só entre a gente e é só porque a gente se ama. Mas, veja bem, não vá pensando que você pode. |