4.12.2010
I love you, my friend
 
Alvy Singer: Here, you look like a very happy couple, um, are you?
Female street stranger: Yeah.
Alvy Singer: Yeah? So, so, how do you account for it?
Female street stranger: Uh, I'm very shallow and empty and I have no ideas and nothing interesting to say.
Male street stranger: And I'm exactly the same way.
(Woody Allen - Annie Hall)

Aproximadamente um ano depois de ter voltado dos EUA, eu já tenho uma opinião bem formada sobre porque não me dei bem com nenhum americano e porque quase enlouqueci na Dollar Land. E não, não vou falar mal de americano (só por) hoje. Esse texto é uma autocrítica.

Aquele é um povo que não se conforma com pouco se ele paga, mas se conforma fácil com o que é de graça. Ai de um garçom que trouxer uma comida fria, ou de qualquer representante de serviço mal executado que se recusar a devolver o dinheiro. Mas eles não questionam a presença militar no Iraque, não questionam a presença de tanto mexicano ilegal na cozinha dos restaurantes, não questionam a existência de um last call que obriga todo mundo a parar de beber às duas da manhã e não questionam o que é amizade. Para ser amigo nos EUA, basta dizer que é. Alguém sorriu pra você, brindou uma cerveja, assistiu um filme junto, that’s it, vocês são amigos. É tão comum chamar qualquer um de amigo, que a palavra “conhecido” (acquantaince) muito raramente é usada. E engraçado que eles se sentem muito ofendidos quando se diz que não, não somos amigos. “Como assim? Você não gosta de mim???”

Agora veja bem como o mundo de relacionamento entre gente superficial e vazia que não questiona nada funciona de maneira muito mais simples e divertida. Não só de amizade, mas qualquer relacionamento, ainda que eventual. Uma vez estava descontente com o serviço da escola que frequentava. Solicitei o dinheiro que paguei de volta (e não foi pouco), dizendo que queria ir estudar em outro lugar. Fui reembolsada fácil. Tão fácil que deu medo. Junto com o reembolso, veio um sorriso super mega nice da tia de Relações Públicas dizendo: “Estou alegre por você ter informado nossa falha. Espero que você seja feliz e boa sorte.” Ela ficou lá alegre, e eu fui embora com meu dinheiro no bolso. Simples assim. Não é ótimo?

Agora imagina um mundo onde todos fossem pentelhos e questionadores que nem eu. A tia da RP me responderia bufando de ódio “Olha minha filha, a gente sempre trabalhou assim e ninguém nunca reclamou, porque aqui nesse college nosso interesse é produzir diplomas, não inteligência. Agora que você descobriu isso, metida a espertinha, enfia seu dinheiro terceiromundista no rabo porque não precisamos dele, vai procurar sua turma e não me enche o saco.” Não seria muito nice. Ninguém seria alegre. Ainda bem que não trabalho em RP.

Desde pequena tenho essa mania irritante de questionar as coisas que se falam e querer que elas sejam exactamente iguais às ações que as sucedem. Aí me recuso a dar bom dia se não quiser mesmo que a pessoa tenha um bom dia. Me recuso a dizer que está tudo bem se não está. Me recuso a dizer seja feliz se quero que aquela pessoa morra pelo menos durante um tempinho até aprender que não se deve me magoar. Me recuso a perguntar como você está se não tenho o menor interesse em saber como você está. E sempre achei isso muito lógico e correto. Sempre tive certeza de que todos seriam mais leves e mais felizes se parassem de dizer coisas a torto e a direito só por convenção.

Aí o Tio Sam me ensinou que essa minha mania é justamente o que complica tudo sem necessidade e é por causa dela que não consigo ter uma convivência pacífica com ninguém em país algum. Ou seja, quem vive no planeta errado sou eu. Porque é tudo muito perfeito e harmonioso quando basta saber dizer e ouvir palavras doces, acreditar nelas e seguir a vida. Chamar todo mundo de amigo, dizer que se importa muito com quem está a sua volta, proferir aquele velho “Conte comigo sempre que precisar viu?” é simples, é fofo, é atencioso, é simpático. Mas estar pronto para fazer parte da vida de alguém de verdade dá muito trabalho. E questionar essa lógica dá mais trabalho ainda. Otária sou eu, que perco meu tempo e sempre termino sozinha. Certos são os americanos, nice, friendly and happy people.

God bless them.
posted by Arlequina @ 4:42 PM  
 



5 Comments:
  • At 2:51 PM, Blogger Fátima Nascimento said…

    " Me recuso a dizer seja feliz se quero que aquela pessoa morra pelo menos durante um tempinho até aprender que não se deve me magoar. Me recuso a perguntar como você está se não tenho o menor interesse em saber como você está."

    Preciso passar um BOM tempo nos States também.

     
  • At 9:00 AM, Anonymous Norrin Kurama said…

    E Sampa? Você está achando a cidade parecida com os istêitis?

    Tambem é um local voltado para a eficiência.

     
  • At 9:31 AM, Blogger Arlequina said…

    não é.

     
  • At 10:14 AM, Blogger nomeexibido said…

    pra aracaju vc n volta mais? mta coisa mudou e está mudando.

    vira e mexe eu venho visitar o teu blog. C continua escrevendo mto bem. Eu já te falei isso? :)

     
  • At 7:57 AM, Anonymous Norrin Kurama said…

    Já vi que você já conheceu o lado lúdico da cidade. Mas a impressão que tive nas muitas vezes que fiquei ai foi que as coisas funcionam bem melhor que no Rio.

    Com todas as falhas.

     
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